"Ando devagar porque já tive pressa..."

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"Ando devagar porque já tive pressa..."

06/03/2012

Sabor de Jaca



Meter o pé na jaca é uma expressão que designa atitude desesperada. Diz-se quando alguém faz bobagem por precipitar-se.
Tenho uma relação íntima com a minha fruta preferida, a jaca. Sendo assim, meter o pé na jaca seria tudo de bom, ao Invés do teor negativo.
Eu adoro jaca! Súbitos desejos me chegam a qualquer hora do dia, de comer essa frutinha meio estranha, mas que eu reputo a mais saborosa de todas. E dentro da lógica das minhas reminiscências, ela aparece como plano de fundo de muitas manhãs de domingo. Lembro demais quando tínhamos jaca em casa. O cheiro exalava cozinha a fora e eu ficava enlouquecida de vontade de devorá-la. Mas tinha o momento certo e este, era no domingo de manhã, após papai acordar muito cedo, varrer o quintal de forma esmerada, colher goiabas ( isso é assunto pra outra crônica), e, finalmente abrir a jaca, num ritual que eu assistia e curtia muito.
Sempre fui muito gulosa e esse defeito trago a até os dias atuais. Mas confesso que, além do gosto de comer a jaca, me inebriava os pormenores do rito. E revisitando a antropologia, me recordo que “o rito é palavra” e como tal, deixa marcas indeléveis.
Naquele momento em que a jaca se abria entre as mãos do meu pai, afloravam os bagos perfumados, suculentos...E o sabor já me enchia a boca, ao mesmo tempo que os olhos. Como era bom ver aquela cena; ele tirava cuidadosamente um por um e ia enchendo uma travessa, depois outra, até que a jaca murchasse em suas mãos e ele a fechasse e a colocasse no lixo.
Então ele me liberava para comer e eu comia tanto que nada mais de fome me restava para o café da manhã. Mas quem precisa de café da manhã se tem jaca para matar sua fome. E a fome que sinto neste momento me fez voltar ao tempo de criança. Fome de vida, de motivos para ser feliz. E eu fui. E sou. E serei sempre, enquanto em mim perdurarem lembranças que me acalentam e me alimentam, como o doce perfume e sabor incomparáveis da minha fruta preferida.
Meterei sempre o pé, a mão e a boca na jaca. E sentirei o gosto de vida contida em minhas lembranças mais queridas.

Lola (05 e 06/03/12)

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